domingo, 26 de setembro de 2010

Verbos proibidos

Vivemos em um país onde o 2o. colocado nunca é lembrado. O que realmente vale e importa por aqui é o primeiro lugar, o topo, a autoria do projeto ou ideia. Nem que tenha que ser na base do "jeitinho brasileiro".

Antes que alguém me critique devo declarar: não apoio e não gosto dessa herança cultural.

Em função dessa mesma cultura, certos verbos aparentemente se tornaram proibidos ou pouco dignos de mérito. Se você procurar na grande maioria dos currículos profissionais vai encontrar muitas frases com os verbos permitidos na primeira pessoa: eu fiz, eu gerenciei, eu criei, eu implantei, eu coordenei, eu tive a ideia principal, eu disse: Faça-se a Luz!

Não se encontram com muita frequência frases dizendo: junto com a minha equipe eu implantei, eu auxiliei na implantação, eu participei da equipe que projetou, a ideia não foi minha mas eu recebi a incumbência de implantá-la, eu não gerenciei mas tive importante participação no sucesso alcançado, nossa equipe ou nosso time conseguiu o êxito depois de um trabalho bem coordenado.

Ao ler os currículos que me chegam às mãos vejo que todos foram gerentes, coordenadores, chefes ou supervisores. Essa falsa titulação não resiste a 10 minutos de entrevista.

Semana passada, assistindo à propaganda eleitoral gratuita notei que essa cultura é fartamente empregada pelos candidatos aos diversos cargos em disputa: todos eles foram os criadores, implantadores ou responsáveis pelos melhores projetos existentes neste país. O mais estranho é perceber que os filhos mais bonitos tem vários pais disputando entre si a primazia de tê-los gerado enquanto que os feios e mal-sucedidos são orfãos, sem ninguém que os assuma.

É óbvio que estou falando de projetos públicos, obras e ações governamentais.

A apropriação é tanta que se você observar atentamente a propaganda da candidata Dilma vai chegar à conclusão que quem governou o país nestes últimos 8 anos foi a própria e não o presidente Lula. Ela é a responsável por tudo que deu certo no governo do PT e estava em todos os lugares ao mesmo tempo. Será que ela tem uma identidade secreta e, na realidade, possui super-velocidade e super-força?

Não creio. Acredito que seja o hábito de se apresentar como pai da ideia, tão comum em todas as camadas de nossa sociedade, levado ao extremo devido aos interesses envolvidos.

Quem viver, verá.

Como disse no início deste texto: falsos títulos não resistem a 10 minutos de entrevista

Falsos feitos não resistem a 10 meses de governo. Assim como falsas promessas.

2 comentários:

Unknown disse...

Muito bom o texto, realmente muitas vezes nos esquecemos do 'nós' e usamos somente o 'eu'.

Porém, ao citar somente a candidata Dilma, acho que deixou transparecer sua opinião política, que acho que não era a idéia principal do texto... acho.

Não apoiei nenhum dos dois candidatos, mas achei que a campanha se baseou não em quem é melhor, mas sim em quem é 'menos pior'.

Mas... voltando ao assunto do texto muito bom.. parabéns...

Pontes disse...

Aline,
A ideia principal do texto realmente não era sobre política, mas como os políticos usam e praticam a apropriação de ideias e feitos em benefício próprio indiscriminadamente. Como não existe auditoria e neste país não existe punição para má-fé, estelionato eleitoral ou simplesmente mentiras ficamos sempre na dúvida né?
Abraços e obrigado pelos comentários.